Da cultura alimentar indígena a sustentabilidade destes povos

O texto foi preparado para ser discutido no I Encontro de Alimentação Escolar Indígena, e, Manaus, nos dias 6 e 7 de dezembro no CEPAN/SEDUC.

No campo da antropologia um dos primeiro ensinamentos que tivemos foi do mestre fundador Malinowski (apud: Marshall Sahlinas [1979], Cultura e Razão Prática, p.89), quando em sua prática metodológica focada na etnografia afirmara que: “Perceber o ponto de vista do nativo, sua relação com a vida, para compreender a sua visão do seu mundo”. Penso que o propósito de nosso encontro vai muito além deste modus operandi da etnografia – do ver e como ver, da relação e sua extensão, da compreensão do mundo – a razão principal é como formular políticas alimentar e nutricional em atenção às comunidades educacionais indígenas do Amazonas respeitando a concepção de mundo destes agentes culturais marcados por sua etnohistória fundamentados em seus modos próprios de aprendizados fincados em valores e processos de formação numa perspectiva intercultural, participativa e cidadã – como parte de um sistema de significação manifesto tanto na vida objetiva (real) dos atores, bem como nas suas múltiplas relações com a natureza (meio ambiente) e a conjuntura sociocultural em processo de formação continuada defendendo a construção de uma Escola Contextualizada comprometida com as culturas e suas determinações históricas, culturais, econômicas e políticas. Dessa feita, alimentação enquanto produto, forma, modo, quantidade cheiro e paladar, como também as práticas pedagógicas destas Escolas não devam ser concebidas desconectadas das culturas destes povos aqui representados particularmente pelos alunos (as) em processo de comunicação com os seus e com os outros a exigir tratamentos diferenciados no trato com estes interlocutores. Para isso, é necessário aparelhar as Escolas investindo na formação dos professores e professoras em discussão com suas comunidades, respeitando seus ritmos próprios quanto à apropriação de determinadas técnicas focadas nas atividades comunitárias que possam agregar valores e novas formas de saber.

Neste contexto, a Cultura Alimentar Indígena encontra-se assentada na razão prática destes povos, como nos explica Sahlins (1979:10), compreendendo a cultura não somente como relação mediadora com o mundo através de uma lógica social de significação, mas, sobretudo, compreendendo a cultura através deste processo em atenção “aos termos objetivos e subjetivos relevantes da relação”. Tal como se pensa a alimentação, que não é só quantidade, mas também qualidade, natureza/cultura – o peixe, a caça, aves entre outros produtos sejam da natureza ou resultantes da produção específica trabalho – contanto, que seja pautada na prática da diversidade cultural visto que de forma alguma não é concebível implantar um Programa Alimentar de cima pra baixo como se fosse uma forma de ajustar as escolas e suas comunidades a um modelo linear.

O panorama da alimentação escolar indígena é de uma complexidade tamanha a exigir da escola práticas diferenciadas junto às comunidades participantes investindo nos alunos (as) enquanto agentes interlocutores capazes de processar, selecionar e catalisar os conteúdos escolares e os apelos dos meios de comunicação de massa, que venham repercutir no âmbito das comunidades e de suas culturas. Da mesma forma que investimos nos alunos (as) para o diálogo interno com os seus é necessário também que o Estado através de seus agentes públicos enquanto representantes de órgãos afins discutam e formulem propostas para serem apreciadas pelos estudantes e suas comunidades. Nestes termos além dos órgãos governamentais presentes reclama-se a presença da Fundação Estadual Indígena do Amazonas, como também do Conselho Estadual de Educação Escolar Indígena e da Secretaria de Estado de Produção Rural do Amazonas, da Associação dos Municípios, da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação, participando das mesas de discussões.
Nesta situação nos deparemos com questões relativas ao Projeto Pedagógicos das Escolas Indígenas e seu vinculo estruturantes com suas comunidades. O aparelhamento das Escolas quanto aos instrumentos necessários para operar o Projeto, a começar pela infraestrutura e seus recursos pedagógicos em atenção à Educação Escolar Indígena focado na Educação, Trabalho (produção), Saúde numa perspectiva de incentivo ao etnodesenvolvimento destes povos. Gestão das políticas públicas de forma integrada e participativa comprometendo os entes federados, as organizações não governamentais com o aval das comunidades indígenas representada por suas lideranças tradicionais ou por jovens indígenas legitimamente constituídos por seu povo. Como se vê a Cultura Alimentar Indígena é uma ação articulada que requer das políticas públicas respostas abrangentes que contemplem a Escola como matriz indutora do etnodesenvolvimento desses povos enquanto sujeito de Direito.

Ademir Ramos

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